27/09/2006

VIII Fórum Internacional de Gerenciamento de Informações de Pesquisa de Mercado

Ontem participei do VIII Fórum Internacional de Gerenciamento de Informações de Pesquisa de Mercado, evento elaborado pelo Comitê de Inteligência Competitiva e Pesquisa, organizado pela ABA (Associação Brasileira de Anunciantes) e ocorrido no Centro Brasileiro Britânico (ACBB), em São Paulo/SP.

Para quem não conhece, a ABA é uma entidade que reúne as principais empresas anunciantes do país com a finalidade de "valorizar a comunicação como ativo competitivo de negócios e representar o anunciante brasileiro, defender seus interesses comuns e contribuir para a contínua evolução técnica das empresas e profissionais, desenvolvendo e recomendando as melhores práticas, inclusive comerciais, aplicáveis".

A primeira parte do evento contou com um painel sobre as técnicas de Etnografia aplicadas à Pesquisa de Mercado. Abrindo o debate Luciana Aguiar, Sócia-Diretora da Data Popular, fez uma crítica sobre o modismo que envolve o tema e explicou que, ao contrário do que muitos pensam, não é de hoje que a Antropologia estuda o consumidor. Segundo ela, desde a década de 80 essa ciência começou a direcionar seu foco de estudo para as relações de consumo. E mais, a técnica etnográfica é usada desde o século XIX, não sendo, portanto, uma onda efêmera.

Eu já fiz alguns posts sobre o uso da Antropologia como ferramenta de Marketing (veja aqui). E sabe por que esse tema é tão importante? Porque a perspectiva antropológica permite uma contextualização dos resultados econômicos. Os estudos pautam-se na dinâmica do consumo, verificando a troca existente entre "produto" e "consumidor", isso envolve status, identidade, auto-afirmação etc, ou seja, os símbolos do coletivo social.

As técnicas da Etnografia são: entrevista em profundidade, observação participante e mapeamento. Em todas elas o objetivo é analisar o consumo a partir da perspectiva do consumidor. Os estudiosos dessas técnicas partem do princípio que existem três variáveis para uma mesma ação: aquilo que os consumidores dizem que fazem, o que pensam que fazem e o que realmente fazem.

Uma pesquisa tradicional através de questionários estruturados ficará limitado ao que os consumidores "dizem que fazem". A técnica da Etnografia é diferente, ela permite criar uma significação para cada comportamento. A palestrante citou dois exemplos. O primeiro diz respeito ao gosto musical das classes mais baixas (leia-se Banda Calypso e afins). No segundo exemplo ela citou um sujeito que gasta R$ 2 mil em uma garrada de vinho. Em ambos os exemplos é muito difícil encontrar uma resposta lógica utilizando pesquisas tradicionais. Somente o método da Etnografia vai permitir mergulhar no universo dos consumidores da Banda Calypso e do vinho de 2 mil, analisando suas influências culturais, religiosas, familiares, étnicas e por aí vai.

O uso da técnica da Antropologia aplicada ao Marketing permite entender os mecanismos simbólicos que envolvem os produtos, extrapolar o discurso do consumidor, descobrir pontos de vista diferentes, listar modos de utilização possíveis para o produto e compôr a cadeia de relacionamento entre os consumidores. As possibilidades são infinitas.

Um bom exemplo do uso prático dessa técnica foi um estudo desenvolvido pela palestrante para uma grande empresa de venda frutas. Os resultados mostraram que expôr uma grande quantidade de frutas no local de venda passa uma idéia de fartura, logo o consumidor associa com preço baixo. Resultado: a empresa aumentou as vendas em 25%. Veja que tudo é uma questão de interpretação do signos, semiótica (veja meu post sobre esse assunto).

Diva Oliveira, Diretora de Pesquisa de Mercado da Recherche, foi a segunda palestrante desse painel. Ela reforçou os conceitos já apresentados e disse que que existe muita confusão semântica entre Antropologia, Etnologia e Etnografia. Para evitar essa dúvida a palestrante disse que basta lembrar que Etnografia é o trabalho do antropólogo. Numa escala hierarquia estariam: Antropologia Cultural, Etnologia (análise) e Etnografia (observação).

A terceira e última palestrante foi Aurora Yasuda, Diretora de Operações de Pesquisa da Millward Brown. Ela falou sobre os 10 mandamentos da pesquisa etnográfica, dentre eles: seja essencialmente um observador, respeite as regras do ambiente da observação, seja objetivo e "ingênuo" e respeite o consumidor de forma incondicional.

Ela ainda traçou os desafios da Etnografia, os mais importantes são: responder às demandas de forma rápida, criativa, útil (e barata, se possível), lidar com dados e fontes distintas, priorizar a visão holística do consumidor e manter o alto padrão e pioneirismo dos profissionais brasileiros.

No final das palestras, tentei fazer uma pergunta, mas fui cortado pelo mestre de cerimônia. E olha que o evento é um fórum. Fórum que ninguém pode falar não é fórum. Eu queria saber se a raça ainda é (se é que já foi um dia) um componente válido na análise antropológica. Digo isso porque nos Estados Unidos é bem marcante a diferença no comportamento dos consumidores negros e brancos, diferente do Brasil (até mesmo pela mistura das raças).

Pausa para o coffee-break. Aproveitei para conversar com a palestrante Luciana Aguiar. Ela explicou que existe sim o componente étnico no consumo. Mas esse componente não é genético, ou seja, o consumidor não nasce predestinado a ter um certo tipo de comportamento de consumo. Quando um consumidor opta por um produto, ele o faz por uma identificação racional (ou emocional) com a marca.

Logo depois do coffee-break foi a vez da apresentação sobre as vantagens do método da Pesquisa Sensorial. Apesar de muitíssimo interessante, achei um pouco massante. A primeira exposição foi feita por Rita Dudziak, Gerente de Pesquisa da Unilever. A moça tem uma grande bagagem de campanhas publicitárias premiadas, como Omo e Dove. Ela definiu a Pesquisa Sensorial em um tripé, formado pela intimidade (empatia), sensualidade (não no sentido sexual, calma, falo dos sentidos) e o mistério.

Ela mostrou com bastante propriedade a importância dos nossos sentidos para o desenvolvimento de estratégias de Marketing. Em um dos exemplos ela falou sobre uma técnica usada pelos corretores de imóveis dos Estados Unidos. Os caras costumam servir cafezinho quentinho durante as negociações dentro da casa a ser vendida. Os potenciais compradores sentem-se (pelo cheirinho do café), como se já fossem donos da casa. Dizem que dá certo.

A segunda palestrante a falar sobre os estudos de Pesquisa Sensorial foi Dulce Perdigão, Sócia-Gerente da Test of the Future. Ela disse que o Marketing não é uma guerra de produtos e sim uma guerra de percepções. A palestrante aprofundou o debate mostrando as diversas técnicas usadas nesse tipo de pesquisa.

Pausa para almoço. A primeira palestra no período da tarde foi proferida por Guilherme Henrique Silva, Diretor de Mídia da Young & Rubican. O cara falou do perfil do consumidor brasileiro, mais do que isso, ele mostrou a dinâmica de trabalho da Y&R. Foi de cair o queixo, tamanha complexidade e organização. A Y&R é a agência de publicidade que tem o maior faturamento anual do Brasil, atualmente está sendo presidida por Roberto Justus (o apresentador de "O Aprendiz" da Rede Record).

Para selecionar as melhores mídias, a Y&R usa um software que cruza centenas de informações sobre o perfil dos usuários de cada veículo com as característica dos compradores de cada produto. Mas ele explicou que o fato do software apontar por onde a campanha deve caminhar, não anula a importância da expertise do profissional de publicidade. Exemplo: um anunciante deseja fazer o lançamento de um produto, que jornal usar? Folha de S.Paulo ou O Estado de S.Paulo? Ambos possuem a mesma tiragem e o mesmo valor de veiculação. Difícil dizer? Pois o software da Y&R responde essa pergunta em dois cliques.

Em seguida Raquel Siqueira, Diretora da Ipsos, fez uma volta ao mundo em 40 minutos. Sério! A missão dela era mostrar as metodologias de construção de tendências. O primeiro passo foi explicar as diferenças entre macrotendências (temas transversais), tendências e manifestações.

Macrotendências é a construção de cenários, conjuntura, contexto. Para exemplificar ela mostrou algumas capas de revista que abordam o medo crescente da população com a violência urbana. Tendência é um onda, um movimento. Ainda usando capas de revista, ela mostrou que cada vez mais as pessoas estão trocando casas por condomínios (em função da violência urbana). Tanto as macrotendências, quanto as tendências, tedem a ser contínuas. Já as manifestações são efêmeras, é a moda, a mania, uma "febre" qualquer.

Na construção das tendências ela falou que as nossas referências estão sob suspeita. Em qual país devemos nos espelhar? Estados Unidos? Mas e os escândalos contábeis, as guerras, o imperialismo? Outro ingrediente desse bolo é o desconhecido em evidência. Hoje o perigo está em todos os lugares (até no passageiro sentado ao seu lado), as potências econômicas agora são asiáticas, cresce a imigração, a natureza mostra sua força com tsunamis, furacões, terremotos. Com isso o mundo está mais acuado, complexo, superficial, carente de valores. Sem dúvida foi uma das melhores palestras do evento. A vontade era prolongar a apresentação por mais algumas horas, pena que não foi possível.

Na seqüência ocorreu uma palestras internacional, ministrada pela americana Jenniger James, Research Director of Roper Reports Worldwide GFK, apresentando os resultados do Estudo Roper Reports, sobre os valores da população dos principais países do mundo e, especificamente, os resultados do Brasil e América Latina. Merece destaque um comentário sobre a importância da fé para os brasileiros. É o povo que mais valoriza a fé entre os países pesquisados. No entanto os números mostram que esse valor está em queda, uma reflexo disso é abertura de lojas as domingos.

Para fechar o evento o americano Ivan Casas, Presidente da eCMetrics, proferiu a palestra "Challenges of Using Online Methodologies in Latin América". Ele apresentou sua teoria sobre a Web 2.0 (uma suposta evolução da internet que conhecemos hoje) e as pesquisas on-line. Ao contrário do que o americano pensava, tudo que ele disse o Brasil já realiza, inclusive com muitas empresas já desenvolvendo suas próprias ferramentas de pesquisas através da internet. Tive que sair correndo para não perder meu vôo, eita São Paulo maluca.


2 comentários:

  1. Opa, dias 10/11 (sexta) e 11/11 (sábado) dá para mim. Mantenha-me informado, por favor.

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  2. Empreendedores brasileiros da Web 2.0 investem em modelos testados nos EUA
    Por Guilherme Felitti, repórter do IDG Now!

    Entre a competição feroz de serviços internacionais e a falta de investimentos, o mercado de Web 2.0 nacional se apóia no gosto do usuário brasileiro por comunidades.

    O termo Web 2.0 tomou forma no final de 2005 não apenas se propondo a oferecer ferramentas que ajudassem o usuário a interagir com o conteúdo online, como o pesquisador Tim O'Reilly definiu o conceito.

    E, como todo conceito, uma nova onda de empresas e serviços chegaram ao mercado de internet. São aplicações online, que libertam o usuário do desktop e do sistema operacional, e, na maioria das vezes, permite a colaboração e participação intensiva do internauta na construção do conteúdo.

    >Conheça serviços brasileiros de Web 2.0

    Você gosta do Flickr, serviço de fotos do Yahoo!? Conhece o Digg, site onde o usuário manda o conteúdo e vota nas notícias mais importantes? Gosta de usar o Writley, do Google, para escrever os seus textos? Bem-vindo, você está na era da Web 2.0.

    Uma nova safra de empreendedores brasileiros está apostando nessa idéia. Com pouco dinheiro, fruto de investimentos pessoais, e com modelos de negócios baseados nos desenvolvidos lá fora, essas empresas ainda não atrairam a atenção dos investidores de capital de risco.

    "Existe um grande espaço para que funções online, como o Aprex, cresçam no Brasil”, afirma Roberto Icizuca, diretor de criação da ZeroUm Digital, responsável pelo pacote de aplicativos online Aprex, com leves inspirações do pacote BaseCamp.

    Por maior que seja o poder das empresas internacionais, o executivo acredita no potencial do mercado entre usuários que não falem inglês ou prefiram trabalhar em português, algo oferecido pelo Aprex.

    Marcus Regueira, gestor da Fir Capital, empresa de capital de risco que investe em novos negócios, vê também potencial para que serviços nacionais compitam globalmente. "O Brasil tem todas as condições de competir globalmente, desde que o modelo de negócios seja genuinamente global".

    Além das habituais qualificações do empresariado brasileiro, como criatividade e domínio de tecnologia, Regueira vê a pequena quantidade de capital disponível como vantajoso, já que desenvolvedores nacionais formulam novos serviços "com menos dinheiro".

    Enquanto novos empreendedores recorrem a investidores, a ZeroUm crê no retorno dos 500 mil dólares investidos do bolso dos próprios sócios em apenas um ano, graças à receita vinda de assinaturas e da reprodução de publicidade para usuários de contas gratuitas.

    “Existem investimentos no Brasil em Web 2.0 e nós somos um exemplo vivo, ainda que sem capital de risco”, afirma Icizuca.

    Regueira, pelo sentido contrário, acredita em um mercado um pouco menos aquecido pelo "estágio emergente do próprio mercado de Web 2.0 no mundo", que não traz nada de tão especial em relação às alternativas brasileiras, segundo o gestor.

    A ZeroUm, no entanto, passa longe do exemplo típico das novas empresas de Web 2.0 que se arriscam no ainda desconhecido mercado brasileiro, por contar com o modelo de assinaturas em um serviço não disponível por provedores internacionais.

    E quem depende apenas dos anúncios? Exemplo desta prova de sobrevivência são os clones do Digg, um site no qual o internauta faz ou envia o conteúdo e depois vota. Assim, as notícias mais votadas vão para o topo da página, as menos são “enterradas”.

    Os brasileiros Eu Curti, o Linkk e o OverMundo, iniciativa de jornalismo cidadão capitaneada por Ronaldo Lemos, Hermano Vianna e Marcelo Zacchi, são exemplos de iniciatavas Web 2.0 nacionais que se basearam nos modelos de sites internacionais.

    Fruto do investimento inicial de 50 mil reais, o EuCurti, que pertentce a empresa Gauge, é exemplo das dificuldades dos empreendimentos da Web 2.0 brasileira. “Hoje, temos uma média de 400 visitas diárias”, afirma Dante Calligaris, sócio da Gauge. O Digg, por exemplo, já conta 8,5 milhões de usuários únicos que acessam o site diariamente.

    Diferenciação
    “Em médio prazo, acho que os serviços nacionais podem sobreviver. O modelo de propaganda online no Brasil ainda está imaturo em relação aos Estados Unidos e à Europa”, afirma Ivan Moura Campos, ex-coordenador do Comitê Gestor da Internet e atual consultor de tecnologia.

    Um dos grandes desafios dos empreendedores nacionais é competir com gigantes internacionais, como Google, Microsoft e Yahoo. Estas empresas contam com infra-estrutura e recursos para desenvolver os serviços online. Depois, são capazes de distribui-los para todo mundo a custo praticamente zero.

    Neste caso, a chave dos empreendedores nacionais é buscar uma forma de diferenciação do competidor internacional. Veja o exemplo do Aure, um serviço que pode ser chamado no Flickr brasileiro, desenvolvimento pela empersa Atípico.

    “A diferença (em relação ao Flickr) é que o usuário poderá enviar fotos para impressão em minilabs direto da interface online”, define Rogério Madureira, fundador e diretor-geral da empresa Atípico.
    Entre agências de publicidade, o habitual mistério que acompanha a idéia de Web 2.0 começa a ser desvendado por empresas de grande porte, que começam a enxergar o potencial do conceito para interagir com faixas mais jovens de clientes.

    “Você só faz dinheiro na web se tiver uma presença online que potencialize a produção dos usuários. O DNA da Web 2.0 é a comunicação de rede. Tudo que explora esta comunicação é bem-vindo e pode ser uma fonte de receita no Brasil”, afirma Abel Reis, vice-presidente de tecnologia da AgênciaClick.

    Ele cita exemplos de empersas como Coca-Cola, que, com a criação de um ranking de blogs dentro do conceito de Web 2.0, o CokeRing, formulou uma maneira de atingir o público jovem.

    Mesmo assim, Reis ainda não consegue apontar exemplos de empresários que venham ganhando no Brasil com Web 2.0, segundo ele, por falta de cultura nacional sobre o assunto.

    “As pessoas estão tateando no Brasil. Quando falamos para o cliente sobre Web 2.0, ele pergunta na hora o que é isto. Se o executivo de marketing não conhece, como podemos esperar que o usuário médio conheça?”, questiona.

    A forte adoção de usuários brasileiros a serviços online também deverá impulsionar o sucesso da Web 2.0 no Brasil, no que Reis chama de “terceira onda da internet”.

    “Blogs e redes sociais criam um fenômeno em que o usuário não é apenas um distribuidor de conteúdo, o que cria condições para a emergência de micros e nanos centros de audiência. E o Orkut é exemplo de que o brasileiro é entusiasta da formação de comunidades”, diz.

    A capitalização dos esforços dos usuários já pode ser observada em grandes portais da internet brasileira, que apostam suas fichas em canais com material enviado por usuários.

    O “Jornalismo Cidadão” proposto pela “Minha Notícia” já atraiu mais de 200 mil usuários para o iG em menos de dois meses de sua criação, segundo dados do portal, e já foi definida como área em que o site dedicará atenção especial.

    Além de também citar a rede social do Google como indicativo, Moura acredita que “a Web 2.0 não só dá dinheiro, mas é inexorável”, tanto entre empresas como entre usuários domésticos.

    “Não podemos nos deixar nos levar por uma nova onda. O atraso pode ser uma vantagem, já que alguém que cria primeiro abre o mercado pra você”, afirma, projetando um aquecimento no mercado nacional após a estabilização da Web 2.0 mundial.

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